Bairro da Sacor

quarta-feira, 3 de outubro de 2007

Tatuagem: arte milenar

Por uma questão de rebeldia, por um profundo significado, ou simplesmente, por uma questão de moda, as tatuagens são, quer uns concordem quer não, um ícone da nossa cultura. E apesar da controvérsia, por parte de muita gente, em ainda aceitar as tatuagens como forma de arte, estas já reúnem muitos adeptos pelo mundo fora.
Mas sendo algo considerado ultra moderno, as tatuagens são uma arte tão antiga como a própria História do Homem. A grande dúvida, prende-se em que local e de que forma a tatuagem surgiu: alguns peritos acreditam que a tatuagem surgiu num único local do mundo sendo depois difundida através das diferentes culturas, outros defendem que surgiu em vários locais do mundo ao mesmo tempo. Desde a época pré-histórica que supõe-se que já o Homem de Cro-Magnon, gravava desenhos permanentes no corpo, extraíndo cores de minerais e vegetais e introduzindo-as na sua pele através de instrumentos pontiagudos, graças à descoberta de estatuetas com sinais geométricos no corpo. A primeira prova concreta do uso de tatuagens na Europa, surgiu com a descoberta da múmia Oetzi datada de 5.300 anos antes de Cristo, nos Alpes italianos em 1991, podendo ser facilmente observadas no seu corpo, ao longo da coluna, as suas tatuagens caracterizadas por pontos e linhas simples, num total de 57 tatuagens. E também com o homem de Pazyryk, múmia descoberta na Sibéria datada entre o século V e IV antes de Cristo, que tem gravado na pele lindos desenhos de animais reais, como tigres, leopardos, cavalos, carneiros selvagens e cervos, às vezes combinados em cenas de caça, assim como outros animais fantásticos, tatuados com grande arte nos ombros, braços e pernas. Os homens primitivos tatuavam-se para marcarem os momentos da vida biológica (nascimento,adolescência, reprodução, morte, entre outros), assim como para assinalarem o seu estatuto e os momentos mais marcantes da vida social (tornar-se guerreiro, chefe ou sacerdote, casar-se, etc).
Também no Antigo Egipto, as tatuagens eram um ritual importante com diversos significados. A segunda múmia mais antiga do mundo é de uma princesa egípcia que apresenta uma grande espiral desenhada na barriga, na região do baixo ventre, que alguns atropólogos associam a possíveis rituais de fertilidade. Outras múmias apresentam tatuagens de conteúdo mágico ou médico. Em algumas delas, como na múmia de uma sacerdotisa de 2000 anos antes de Cristo, existem linhas horizontais e paralelas à altura do estômago, possivelmente para protecção contra a gravidez ou doenças. Outras múmias com o mesmo tipo de sinais foram encontradas no vale do rio Nilo, e os especialistas acreditam que nas múmias do sexo femenino as tatuagens tinham um efeito cosmético, para realçar a sua beleza. A múmia do faraó Ramsés III ostenta ainda hoje, orgulhosamente, tatuagens cheias de significados até agora indecifráveis. Ainda no vale do Nilo foram encontradas outro tipo de múmias, algumas destas, até tinham as mãos amarradas nas costas, que se supõe serem de prisioneiros, e cujas tatuagens possívelmente serviriam para marcá-los para não fugirem. Como se pode constatar, as tatuagens no Antigo Egipto adquiriram uma importância que vai desde o sagrado, o sobrenatural e o mágico, à medicina, passando pela estética, até ao da identificação de prisioneiros.
No Japão, durante o século VI, a tatuagem era utilizada para identificar criminosos e exilados. Os exilados eram tatuados nos braços com uma cruz que podia localizar-se no antebraço na parte interna, ou uma linha recta na parte superior do antebraço ou na parte superior do braço. Os criminosos eram tatuados com uma variedade de simbolos que designavam os lugares onde os crimes foram cometidos. Para um jovem japonês preocupado com a sua imagem na sociedade, ser tatuado era uma punição severa. No entanto, no final do século XVII, a tatuagem foi começando a perder a conotação negativa que tinha tido até então, os penalizados começaram a esconder as suas tatuagens penais com tatuagens decorativas, com padrões decorativos maiores. Também numa novela erótica da época era relatado que a tatuagem era uma garantia de amor, passando esta a ser muito popular entre várias classes: cortesãs, prostitutas, sacerdotes, entre outros. No século XVIII com o regime autoritário e repressivo de Togukawa, a tatuagem é proíbida devido à associação entre a antiga actividade e criminosos, com o argumento de que era "um delito à moral pública". No entanto, apesar dos esforços do regime para tentar acabar com a arte, esta continuou a florescer entre bombeiros, operários e outros sectores das classes mais baixas da sociedade. Foi nesse período que Yakuza, a máfia japonesa, começou a recrutar camponeses e operários sem dinheiro que haviam migrado para Tokyo na esperança de melhorar a vida. Ao entrarem no grupo tinham que fazer um voto de devoção à máfia, que era feito através da elaboração da tatuagem. Ao exibirem as suas tatuagens, o grupo Yakuza mostra que não conseguiu entrar na sociedade comum japonesa, e que por outro lado está unido com a máfia japonesa sendo capaz de por ela até dar a vida. As tatuagens entre os membros Yakuza simbolizam a lealdade e o respeito para com o grupo.
Também na Europa, as tribos Cruithnes, que viviam nas florestas onde hoje são a Inglaterra, a Irlanda e o País de Gales, conhecidas pelos soldados romanos como Picts ou Pictish (que significa em latim "homem pintado"), tatuavam-se muito. Eram muito conhecidos por lutarem apenas vestidos com as suas tatuagens o que lhes permitia ter liberdade de movimentos e de não gostarem de lutar com armaduras pesadas.
Os Cruithnes tatuavam-se com raios, tribais e totens como símbolos de identificação para um grupo e acreditavam ser uma combinação de poderes e forças. Os Cruithnes acreditavam que a tatuagem ficava gravada na alma e que na passagem da vida terrena para a vida espiritual, para se reunirem com os seus familiares, tinham que mostrar as suas tatuagens na chegada à "Terra do Sol".
Embora mais tarde,no século VIII, mais concretamente em 787 d.C., o Papa Adriano proíbisse a pratica das tatuagens por considerar ser um costume bárbaro, o que fez com a tatuagem ficasse esquecida no velho continente, a tatuagem teve um papel fundamental no Cristianismo. Na clandestinidade, sob o jugo pagão, para se identificarem e se reconhecerem entre si, os primeiros cristãos tatuavam nos seus corpos diversos sinais entre os quais a cruz, as letras IHS (abreviatura do nome Jesus), o peixe, letras gregas, etc. Geralmente estes desenhos situavam-se nos pulsos, no rosto ou nas pernas.
Mas claro que quando falamos na história da tatuagem, não podemos deixar de referir as dos povos das Ilhas do Pacífico, dos povos nativos da Nova Zelândia (os Maori), e o seu estilo único de tatuagem conhecido por Moko.
A tatuagem da Polinésia é uma das mais artísticas do mundo antigo, desenvolvendo-se durante milhares de anos nas Ilhas do Pacífico Sul. No seu estilo mais avançado, as tatuagens são caracterizadas por desenhos geométricos. Os desenhos eram normalmente trabalhados, aumentados e renovados ao longo da vida, até que o corpo ficasse completamente tatuado. Quanto mais bravo um guerreiro fosse, mais tatuagens teria no corpo.
O Capitão James Cook, que chegou às Ilhas em 1700, foi um dos responsáveis pelo renascimento da tatuagem na Europa.
Ao ver como o procedimento era feito, através de ossos ou conchas muito finos (semelhantes a agulhas), que eram molhados em pigmentos e que depois, com um martelinho perfuravam a pele introduzindo a tinta, relatou no seu diário referente à sua primeira viagem o que tinha visto, utilizando uma nova palavra, "tattow" (de que derivou depois a palavra "tattoo", e na nossa língua a palavra "tatuagem"). A palavra "tattow", era derivada da palavra "tatau" dos nativos, que era associada ao som que surgia durante a execução da tatuagem.
Um dos costumes dos Maori, era que quando havia batalhas entre tribos, os membros da tribo vencedora ficavam com as cabeças tatuadas dos guerreiros inimigos, embalsemando-as, constiuíndo um troféu de guerra, e utilizavam-nas em rituais religiosos. Quando os Europeus começaram a visitar a Nova Zelândia e a estabelecerem-se lá, as cabeças não tinham qualquer valor comercial, apenas sentimental. Até que os coleccionadores exóticos e os museus começaram a ter o desejo de possuí-las, começando deste modo uma grande e cruel demanda. Hesitantes, pois para os Maori estas cabeças significavam muito, os nativos foram atraídos pela troca por armas de fogo, que os comerciantes europeus se proponham a oferecer-lhes, a troco das cabeças tatuadas.
A troca comercial entre Europeus e nativos começou a crescer, até que a dada altura, a procura começou a exceder a oferta. Foi então que se seguiu um tráfico vivo. Em muitas tribos começaram a tatuar escravos (honra que não lhes era atribuída), para, posteriormente, as suas cabeças serem vendidas. As tribos também começaram a ser desafiadas para lutar entre si, muitas vezes sem motivo aparente, apenas para conseguir os troféus. Esta barbárie só teve fim quando a imprensa londrina publicou histórias sobre o escândalo, e o governo inglês proíbiu o tráfico de cabeças tatuadas.
No dia 8 de Dezembro de 1891, Samuel O' Reilly patenteou a primeira máquina de tatuagem. Inspirado na impressora autográfica (também conhecida por pena eléctrica), inventada por Thomas Edison, e incentivado pelo objectivo de permitir tatuagens mais elaboradas e um método mais rápido, Samuel, americano residente em Nova York, inventou a primeira máquina de tatuagem, examinando uma impressora autográfica, e fazendo-lhe algumas alterações. Adicionou-lhe agulhas múltiplas e um reservatório de tinta, mudou o sistema de tubos fazendo com que a máquina oscilasse electromagneticamente e permitindo que esta movimentasse a agulha. O aparelho era composto de cinco agulhas, mas podia consistir somente, uma agulha. A partir deste modelo, outros tatuadores foram fazendo melhoramentos e novas versões até às máquinas que existem actualmente. Na década de 70 é que surgiu o modelo mais próximo das máquinas de tatuar existentes hoje em dia, patenteado por Carol Nightingale.
Acreditem que a História da Tatuagem é ainda muito mais vasta que tudo isto que leram no nosso blog, com teorias mais, ou menos consistentes, com provas convictas ou ideias que ainda não passam de susposições. Um dos motivos, talvez mesmo o principal, que torna a arte da tatuagem, uma arte tão especial, é que em vez de uma obra de arte que se pode simplesmente possuír, uma tatuagem é uma obra de arte que faz, literalmente, parte de nós. A partir do momento em que é feita, a tatuagem é como uma qualquer parte do corpo, e está sempre ao nosso lado, nos bons e nos maus momentos. É um amigo para toda a vida.
Os motivos que levam alguém a fazer uma tatuagem, podem ser desde a rebeldia e chocar a sociedade ou alguém em especial; uma questão de identidade; recordar uma fase da vida importante ou assinalar o ínicio de uma; um desenho de algo, ou que represente algo de importante e pessoal; o retrato de alguém especial; por uma questão de realçar a beleza; homenagear um familiar ou amigo já falecido.
Quando se acaba de fazer uma tatuagem, se esta é feita com convicção, responsabilidade e consciência, posso garantir que é uma sensação única, sentimo-nos mais completos e realizados, belos e únicos, especialmente se a nossa tatuagem for um modelo exclusivo.
Acabaram de ler este post e querem ir já correr fazer aquela tatuagem que andam para fazer há muito tempo, mas que ainda não tiveram coragem. Muito fixe, mas antes há regras e cuidados que é importante terem em conta:
-Verifiquem se o local onde vão fazer a vossa tatuagem está devidamente aprovado pelas autoridades sanitárias.

-Verifiquem se o estúdio tem auto-clave (que é uma máquina que esteriliza o material não descartável), e se o material descartável é aberto à vossa frente.

- Quando está a tatuar, o tatuador deve usar luvas e máscara.

-Para terem a certeza de que vão ficar com uma verdadeira obra de arte na pele, ou que o desenho que pretendem vai ficar tal como gostam, vejam os trabalhos já realizados pelo tatuador, para terem a certeza de que é um artista à vossa medida.

-Se a tatuagem que pretenderem fazer for um modelo esclusivo, falem com o tatuador e troquem ideias com ele. Sejam explicitos naquilo que querem para que o tatuador capte a vossa ideia. Oiçam também as opiniões do profissional, porque ele pode sugerir-vos ideias para realçar ou melhorar o vosso desenho.

-Escolham algo com que realmente se identifiquem e que tenham a certeza de que não se vão arrepender.

-Durante a cicatrização da vossa tatuagem, sigam todos os conselhos que forem dados pelo vosso tatuador. Lavem a vossa tatuagem com um sabonete neutro, de preferência de glicerina (à venda nas farmácias), se no entanto não tiverem um sabonete de glicerina à mão, pode ser um sabonete neutro suave (ex: sabonete Dove), o essencial é que seja neutro. Passem uma pomada cicatrizante (normalmente é Bacitracina ou Bepanthene Plus), mas que seja recomendada pelo vosso tatuador, duas vezes por dia.

- Não apanhar sol, nem tomar banhos de mar ou piscina nos primeiros 15 dias.

-Não coçar nem arrancar possíveis crostas que se formem, as crostas fazem parte do processo de cicatrização, e uma cicatrização bem feita é o essencial para uma tatuagem perfeita.

Muito bem, mas muitos de vocês que nunca fizeram uma tatuagem devem estar a perguntar-se: e dói?
Bom, a questão da dor é muito relativa. Falando pela minha experiência, eu diria que a dor é algo muito suportável, e que muitas vezes nem se sente dor sequer. Mas a resistência à dor varia de pessoa para pessoa. A zona onde se vai fazer a tatuagem também influencia a intensidade da dor. Zonas mais ossudas doem mais, e zonas com mais carne doem menos. A técnica e a experiência do tatuador também contam muito. Um tatuador experiente consegue fazer que se sinta o menos dor possível, sem que isto tenha qualquer influencia negativa na qualidade do trabalho.
Felizmente que hoje em dia, a tatuagem já é aceite com normalidade no mundo do mercado de trabalho, embora ainda hajam alguns sectores mais conservadores. Por incrível que pareça, um dos sectores em que existe mais restrições no que diz respeito às tatuagens, é o da moda.
Existem muito poucos modelos tatuados, ou quando o são, fazem tatuagens muito discretas e/ou em sítios discretos, ou então quando terminam as suas carreiras como manequins. No entanto, há modelos tatuados que marcam a diferença no mundo da moda, como é o caso da modelo brasileira Marina Dias. No mundo empresarial, a tatuagem também já tem uma maior aceitação. Porém, no caso das empresas mais conservadoras, o segredo é fazer num sítio onde se possa esconder. Muito embora, na minha opinião, uma pessoa não ser admitida numa empresa por ter uma tatuagem é um disparate e soa-me "a mandarem no corpo de cada um". Uma coisa é estar tatuado da cabeça aos pés, e isso numa empresa "às vezes não funciona", pelo menos por enquanto, outra é ver que alguém tem uma, duas, ou três tatuagens médias no corpo, e não o admitem ou despedem-no, porque acham que a imagem que apresenta "é imprópria"...
Mas quer uns gostem, quer não, as tatuagens vão sendo cada vez mais aceites no quotidiano, e embora muitos ainda não as valorizem como merecem, são sem dúvida, uma das mais singulares formas de arte. Uma arte milenar...

2 comentários:

§©ªJoker«¬­® disse...

Sóninha amiga.
Isto é o que se chama de um trabalho de pesquisa completa e incrivélmente esplanada , ao ponto de se tornar uma obra prima da investigação jornalistica.
ADOREI
beijos
Alfredo cruz

Unknown disse...

muito legal! vcs são imparciais e escrevem com fundamentos históricos, acho que esse tipo de trabalho é uma ótima maneira de informar e consequentemente diminuir o preconceito existente até hj! (Se bem que acho, que até certo ponto, o preconceito faz parte de uma forma até legal, já que em tudo há preconceito, só não podemos aceitar o preconceito absurdo) enfim... a arte está ganhando um espaço nunca visto e derrubando certos "muros de Berlin" que separavam os tatuados e/ou tatuadores de uma vida social mais harmoniosa...
Abraços a todos vcs!
Vamo q vamo!
estou disposto a discutir o tema tbm nestes contatos:
*orkut... Kaeda Tattoo Stúdio
*msn... kaedatattoo@hotmail.com
Sintam-se a vontade para add...

Obrigado...
*Rodrigo Kaeda